Os que deixam o sacerdócio





Os que deixam o sacerdócio

Hoje fui almoçar com outra sacerdotisa, com quem não falava há alguns meses. No meio da conversa aproveitei por perguntar sobre pessoas que eu conhecia e que eram do grupo dela.

A resposta dela me deixou chocada porque muitos deles deixaram o sacerdócio. Não, não estou falando em deixar a tradição, o coven, o grove, estou falando sobre deixar o sacerdócio!

Pera aí, como assim deixaram o sacerdócio? Como alguém pode deixar o sacerdócio? O juramento de iniciação não é para a vida inteira?

Pois é, para muita gente parece que não é.

Para mim a noção de alguém deixar o sacerdócio é tão alienígena como uma banana com recheio de melancia (se bem que eu acho que gostaria de comer isso, seria uma melancia pequena, fácil de comer). Eu vejo o sacerdócio aos Deuses antigos como parte tão integrante de minha vida hoje que acho impossível pensar em minha vida sem isso.

Desde que eu encontrei a Deusa nada me pareceu tão importante ou tão apaixonante quanto servi-la. Eu passo a maior parte do tempo em que estou acordada vivendo meu sacerdócio de uma forma ou de outra. Como alguém que já viveu o contato com os Deuses pode desistir de seu sacerdócio? É uma pergunta para a qual não tenho resposta.

Eu entenderia se nossa religião fosse como algumas das mais conhecidas em que as pessoas são arrastadas para as práticas religiosas dos pais ainda quando crianças e são criadas com a noção de que não existe outro caminho possível. Quando ficam adultas, boa parte dessas crianças se rebela contra a verdade absoluta pregada pelos pais e vai buscar sua própria verdade no mundo. Mas nossa religião não é assim. Para começar, na maioria das tradições, você só se torna um iniciado dos Deuses se for maior de 18 anos. Em algumas delas, apenas quando você se mostra capaz de prover seu próprio sustento.

Não estamos lidando com crianças que nunca conheceram nada melhor. Não estamos lidando com pessoas que foram obrigadas a fazer o juramento de iniciação. Estamos lidando com adultos, que vieram para a bruxaria por escolha própria, que insistiram para serem aceitos em um coven ou tradição, que passaram no mínimo um ano e um dia de dedicação antes de chegar ao ritual de iniciação. Estamos lidando com pessoas que praticaram e estudaram, que pesquisaram e testaram para ver se queriam mesmo este caminho.

E ainda assim, depois de tudo isso, ainda tem gente de desiste do sacerdócio.

E eu me pergunto, assim como minha amiga sacerdotisa perguntou: “que parte do isso-é-para-a-vida-toda essas pessoas não entenderam?” Elas realmente acreditam que o sacerdócio é uma roupa que podem tirar quando não estiver mais na moda? Acham realmente que renegar seus votos, tomados diante dos Deuses, dos elementos e outros poderes não terá conseqüências para a vida delas?

Nenhuma delas foi obrigada ao juramento. Ninguém foi na casa delas arrastá-las para a bruxaria. Seu juramento não foi feito no dia em que elas chegaram. Elas tiveram meses, anos até antes do juramento para desistir de fazê-lo. Mas uma vez feito, não tem volta. E a pessoa será cobrada por este compromisso.

Nós costumamos usar a metáfora, criada por outra sacerdotisa, que dedicação é um namoro com a Deusa, para ver se você quer se casar com ela na iniciação. E, ao contrário dos casamentos entre pessoas, este casamento é “até que a morte os separe”. E além, pois aqueles que ouviram o chamado da Deusa em uma vida, ouvirão novamente na vida seguinte, e na seguinte, e na seguinte.

A única coisa que posso pensar é que essas pessoas talvez estejam vivendo a Lua negra de seus próprios ciclos e que um dia, encontrarão o caminho de volta para a Deusa, talvez renovados em seu amor e devoção.

Se não for assim, espero sinceramente que ela tenha compaixão deles quando for cobrar sua dívida.

Naelyan


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Naelyan Wyvern é a fundadora e Alta Sacerdotisa da Tradição Caminhos das Sombras.