Estou lendo o livro City Magick, do Penczak. Eu adoro o Penczak, para mim ele é um dos grandes nomes da Bruxaria Moderna.
City Magick versa sobre a magia das cidades, nas cidades e para as cidades. Ainda na introdução, o autor conta que, quando teve a idéia para escrever este livro, vários outros bruxos foram contra, alegando que não dá para se fazer magia na cidade ou que as cidades são o mal do mundo. Ele comenta que achou esta postura meio hipócrita, vinda de pessoas que vivem com os confortos que a cidade pode prover. Algo com que eu sempre concordei.
Vejam bem, eu sou essencialmente, uma Bruxa Urbana. Adoro os confortos da cidade, adoro dirigir meu carro, adoro tecnologia. Sou Engenheira Eletricista por profissão para começo de conversa. Comecei minha carreira profissional como Técnica em Eletrônica. E mesmo antes de me dedicar à Bruxaria eu já acreditava no conceito de fazer magia para cuidar das cidades em que vivemos. Pois mesmo minha magia era, de alguma forma, associada às cidades. Ou seja, todos os aspectos da minha vida estão relacionados às cidades e sua tecnologia.
Depois de entrar para a Bruxaria eu fui solitária por muitos anos e vivia muito confortavelmente em minha prática pessoal. Mas um dia eu comecei a ter contato com outros bruxos e foi um choque perceber que muitos deles condenavam minha urbanidade, digamos assim. Eu já ouvi coisas como: “Como você pode se considerar bruxa se vive em um apartamento?” “Você jamais será uma bruxa a menos que saia da cidade e comece a viver mais em contato com a terra.”
Como sempre, ao ouvir essas opiniões, eu pensei na possibilidade de que eles estivessem certos (seu sempre penso que existe a chance de que eu esteja enganada e qualquer assunto, por mais certeza que eu tenha. Sempre avalio a idéia que estou ouvindo, por mais contrária que pareça ao que eu penso). Será que eu estava me enganando ao pensar que eu sou uma Bruxa porque não estou disposta a deixar minha vida e minha carreira para viver no meio do mato? Será que minha urbanidade me baniria do paganismo? (Bem, sendo sincera, o conceito de pagão urbano é uma contradição, uma vez que pagão originalmente significa habitante do campo.)
Depois de passar algum tempo cortejando essa idéia, fui fazer o que sempre faço quando tenho dúvidas espirituais, fui pedir ajuda aos universitários, ou no caso, aos doutores: a própria Deusa. Fui meditar e desta vez, fui meditar em meio ao que meus interlocutores consideravam natureza, no meio do mato, sem nada criado pelo homem ao redor. Sentada embaixo de uma árvore, espantando o ocasional mosquito e tentando evitar pensar na reação alérgica que eu teria às picadas que havia recebido, eu me esforcei para entrar em contato com os espíritos do lugar e para ouvir a voz da Deusa nesta questão que me preocupava.
Minha atenção foi atraída para um grande formigueiro perto de onde eu estava. Fiquei um tempão prestando atenção às formigas e pensando no impacto que causamos ao mundo construindo nossas, ruas, avenidas e prédios. Foi quando caiu a ficha. Será que as formigas sentem-se culpadas pela modificação que fazem no meio ambiente ao criar sua comunidade? As abelhas sentem isso ao criar uma colméia? E porque um formigueiro é considerado parte da natureza e nossas cidades não são? Nossas cidades não são exatamente a mesma coisa, grandes formigueiros para seres humanos?
Então eu comecei a pensar na questão do que é considerado natural ou não. No que é considerado natureza. Durante muitos séculos, as religiões dominantes fizeram o homem pensar que ele estava fora da natureza, um ser superior, destinado a explorar e controlar o mundo ao seu redor. O homem fora feito à imagem e semelhança do Deus distante e tudo o que temos aqui foi feito apenas para servir e agradar ao homem. O resultado deste pensamento é a crise ambiental que hoje vivemos e a quase extinção de nossa própria espécie devido a nossos próprios atos.
Nossa religião, como muitas desta era, veio nos ensinar que não estamos desconectados do mundo que nos cerca, mas sim somos parte da grande teia da vida. Somos responsáveis pela terra inteira e devemos agir de forma ecologicamente consciente, não por bondade, mas para garantir nossa própria sobrevivência. A Terra não tem a menor necessidade de que cuidemos dela, ela pode muito bem cuidar de si mesma, a grande questão é que, se continuarmos abusando do jeito que estamos abusando, pode chegar a hora em que ela decida que NÃO precisa de nós e de nossa poluição.
Em um embate entre nós e o planeta, ele sobrevive, nós não. E sem a humanidade, o planeta terá milênios para se recuperar tranquilamente de nossa passagem e para escolher a própria espécie dominante, que talvez seja menos estúpida do que a nossa.
Uma vez eu li uma frase que ilustra muito bem a minha crença pessoal em relação a nosso relacionamento com o planeta: “A intolerância começa onde impera o abuso. Não devemos brincar com a paciência de nosso planeta.”
Eu acredito sim em viver de forma ecologicamente consciente, não porque devemos ser bonzinhos com o mundo, mas porque precisamos fazer isso para garantir que haja um futuro para nossos descendentes.
Só que ultimamente eu tenho percebido que o pensamento de nos ligar à grande teia da vida deu origem a uma nova forma de preconceito. Antes, o homem considerava que tudo o que era natural era inferior. De uns tempos para cá, muita gente, particularmente praticantes de caminhos de origem xamânica, começaram a considerar que só o que é natural tem valor e que tudo o que é feito pelo homem é inferior. Mas , vem cá, isso não é apenas uma nova forma de cometer o mesmo erro? Ao considerar nossas cidades não naturais e não mágicas não estamos mais uma vez nos alienando da natureza ao nosso redor? Porque se somos parte da natureza, porque nossas cidades não são?
O autor do livro comenta sobre tudo isso e ainda mais, ele diz que muitos praticantes usam o fato de viverem em cidades como desculpa para serem “praticantes de poltrona”, pessoas que nunca colocam a mão na massa de verdade, que vivem dizendo que, quando forem ricos poderão viver longe da cidade e então serão praticantes de verdade.
Eu mesma já ouvi o seguinte comentário de uma pessoa: “ah, todos os meus rituais são feitos no astral porque eu moro em um apartamento e não dá para traçar círculo mágico dentro de um apartamento.”
Ou “eu não tenho altar porque o único espaço que eu tenho é no meu quarto e lá não é lugar para colocar um altar. Um dia eu vou morar numa casa grande e então poderei ter um altar.” E esse mantra está sendo repetido há mais de 10 anos!!!
Depois, o autor discorre sobre a formação das cidades, alegando que provavelmente as pessoas sentiram-se atraídas para formar uma comunidade em um determinado local justamente porque os espíritos daquele local são compatíveis com os seres humanos. Ou seja, determinados espíritos querem a presença humana, chamam a presença humana para viver perto deles e as cidades surgiriam ao redor destes locais. Ele então fala sobre os pontos e linhas de poder de uma cidade e na quantidade de poder que desperdiçamos ao rejeitar os centros de poder da cidade como fonte de energia para nossa magia.
Infelizmente, depois desta fascinante introdução, ele resolve ajudar seus leitores a fazer magia começando com as explicações mais básicas de todas e temos todo um capítulo que ensina a meditar, visualizar e traçar círculos. Espero que ele evolua além do básico do restante no livro senão vai ser muito chato.
Naelyan